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sexta-feira, 30 de abril de 2010

(SUPERLIGA) Lorena, o Herói de Montes Claros


Se eu penso na seleção? Ainda não parei para pensar nisso, mas quero estar na lista do homem (Bernardinho)"

O receio de andar pelas ruas é o de alguém que não estava preparado para um assédio proporcional ao seu tamanho. Quando chegou a Montes Claros, vindo de cinco temporadas na Europa, Lorena era apenas um homem alto, com "nome" de mulher, que jogava um esporte pouco conhecido na cidade. Não podia imaginar que, pouco depois, despertaria naquelas pessoas uma admiração descontrolada. Ele está nas fotos arquivadas nos celulares, nas vitrines, perambulando pelos bairros, no imaginário de crianças, jovens e senhores. Ganhou todos com seu jeitão explosivo e atencioso, com seus saques e cortadas não menos potentes. Ganhou, como ele brinca, status de jogador de futebol, numa cidade que passou a comemorar cada vitória do vôlei como se fosse uma final de Copa do Mundo.


- Eu estava esquecidão... fiquei cinco anos fora do país. Quando cheguei, falavam que tinha time de futebol, mas que não era de expressão, e não se comentava muito sobre esporte. Hoje nós não podemos andar em nenhum canto da cidade. Começa a encher de gente, para motoqueiro do lado do seu carro para pedir autógrafo. A cidade respira vôlei. Não adianta nem tentar se disfarçar, porque a gente é muito grande - brincou o oposto, que enfrenta o Florianópolis na decisão da Superliga masculina, neste sábado, às 9h30m, com transmissão da Rede Globo e do SporTV.

Nem sempre foi assim. No início do projeto, ele lembra que o ginásio, com capacidade para 8.600 pessoas, ainda não estava pronto e foi enchendo de pouquinho em pouquinho, à medida que a equipe ia vencendo. 

- Depois que ganhamos o Mineiro, desfilamos em cima do caminhão do Corpo de Bombeiros como se tivéssemos vencido a Copa do Mundo. A Superliga começou e o ginásio foi enchendo, enchendo, até que todo mundo estava falando de vôlei. É uma coisa impressionante. Eu nunca vi. Passaram a colocar telões em vários bairros, todo mundo com a camisa do time, os carros parados comemorando as vitórias. Para comprar ingresso tinha até briga. A polícia tinha que fazer proteção. Hoje a gente vê meninos de 10 anos falando que querem jogar vôlei como nós.

Apesar de se divertir com a nova condição, Lorena sabe que, para uma pessoa, a temporada não foi das mais fáceis. A mulher, Aurelie, aceitou deixar o seu trabalho na França para poder acompanhá-lo. Teve de se adaptar a uma cidade com clima, cultura e estrutura completamente diferentes do que estava acostumada e ainda aprender a lidar com o assédio ao marido. 

- Para ela foi muito difícil ficar longe de tudo e da família também. Ficou completamente perdida longe de Belo Horizonte e São Paulo. Ela aprendeu a falar a língua. E, como é europeia, não está acostumada com a forma de assédio que se tem aqui. É engraçado porque ela briga comigo. Para quem é solteiro é complicado sair na cidade, todo mundo fica observando o que a gente faz. É um BBB. O Talmo (técnico) se amarra, é todo direitinho. E todo mundo tem que ficar também - diverte-se o jogador.

Lorena diz não saber se vai permanecer no time, mas Aurelie já dá indícios de que o endereço do casal vai voltar a ser a Europa. Nas ruas, o disse-me-disse dos torcedores também já aponta para a necessidade de uma despedida próxima. O que eles lamentam. A estrela do time partiu para o jogo final em São Paulo com a previsão de só retornar ao Norte mineiro depois de 15 dias. Precisa voltar ao país da mulher. 

- A cultura é diferente, a cidade é diferente. Aqui faz muito calor. Não tenho feito muita coisa desde que cheguei. Dei aulas de francês, joguei tênis, fui ao shopping... é difícil ter que ficar mudando de país para acompanhar o marido, mas temos que fazer escolhas. Sei que no próximo ano vou trabalhar na minha empresa, na França. Ele é que vai me acompanhar - sorri Aurelie, formada em Comércio Internacional e Marketing.

O português falado com sotaque demorou um ano para ser aprendido. E vai ajudar Aurelie quando for passar férias no Rio, onde o casal vai comprar um apartamento. Ex-jogadora de vôlei de praia, que tinha como parceira a irmã gêmea, Emanuelle, a bonita francesa chegou a enfrentar duplas brasileiras no Campeonato Europeu. Apesar de ter mudado a vida por conta da profissão do marido, Aurelie diz estar feliz com o sucesso que ele alcançou. 

 

Sucesso que nem no melhor dos sonhos Lorena esperava encontrar logo no seu ano de retorno ao vôlei brasileiro. Além de ídolo de uma cidade, ele se tornou o maior pontuador da história da Superliga numa mesma temporada. 

- Se eu penso na seleção? Ainda não parei para pensar nisso, mas quero estar na lista do homem (Bernardinho). Seria um sonho. Está tudo indo muito rápido... eu não imaginava ter uma volta para o Brasil assim. Achava que Montes Claros ia ser uma boa equipe, mas não que ia ganhar tudo. Nós não tínhamos jogador de nome no mercado internacional, mas todos mostraram que são de alto nível. Esse grupo é uma grande família. Nos momentos difíceis todos estavam lá. Está sendo o melhor ano da minha vida.

O sorriso fica ainda maior quando ele tenta responder à última pergunta. 

- Se ganhar esse título, eu não quero e nem consigo imaginar o que vai acontecer na cidade. Minha mulher falou que teve foguetório em jogos que fizemos, que parecia final de Copa do Mundo. As pessoas no aeroporto já falaram que vão colocar uma TV pra ver o jogo de sábado. A cidade vai parar! 

Vai.

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